sexta-feira, abril 27, 2007

Mais do que nunca

“We know a place where no planes go
We know a place where no ships go.”

“I will never know the names
of these places that I travel through
to reach the coastline –
I’ve been told I will be there in time.
Please oceancloud,
Let there be no storm on the crossing below.”


Mais do que nunca, preciso de sair daqui (de Coimbra, de Lisboa, das ruas que conheço, do país...). Como desejava ser como Deleuze, viajar sem sair do lugar! Não pela mesma razão, porque eu, ao contrário de Deleuze, adoro viajar, mas porque necessito de viajar como uma droga. E, neste aspecto, penso em Deleuze, também: “A droga faz por vezes delirar – por que não delirarei eu sobre a droga?”. Creio que esta minha vontade vem crescendo com o meu cansaço. Até há algum tempo, tive prazos muito rigorosos de entregas de trabalhos, reuniões, defesas, etc. Tinha umas coisas a seguir às outras, como se costuma dizer. Depois da defesa do meu último trabalho de seminário, entrei nesta nova fase. Sem prazos, ou com prazos mais flexíveis, posso gerir o meu tempo de outra forma. Mas estou a detestar. Creio que é desde o Verão que não paro, portanto esta nova fase deveria ser benéfica. Deveria parar a minha cabeça (embora a estrutura da tese de Doutoramento seja urgente e tudo seja urgente) e deixar de pensar durante uns dias. Pegar numa pequena mala e ir passar esses dias a qualquer lado. Vinha hoje na viagem para Lisboa a pensar nisso e como, mais ou menos por esta altura, no ano passado, fiz isso, embora tivesse mesmo de o fazer e tivesse levado o computador atrás. Já escrevi aqui muitas vezes sobre viajar. O que significa viajar e por que é tão importante para mim viajar. Tão importante, que a minha tese de Doutoramento é uma viagem. Depois de perder o Prémio Fernando Távora, escrevi ao José a dizer que, mesmo sem prémio, a minha viagem iria concretizar-se, porque ela é a minha tese. E coloquei, propositadamente, “é” em itálico no e-mail para o José. Salvaguardado (pelo itálico) o meu sempre exagerado entusiasmo, o José compreende, como ninguém, a minha afirmação. E não é só por ser o meu orientador e já me conhecer bem, mas porque aquela viagem me permitirá desvelar segredos profundos... que não descobrirei, se não sair daqui.
Mas a razão por que necessito mais do que nunca de sair daqui é, como dizia hoje ao Gonçalo, a de precisar de delirar. Sinto falta de delirar. Tenho delirado pouco. Não é patetice ou exagero (a maior parte dos meus amigos oscila entre estas duas opiniões pelas minhas posições extremas, em relação às minhas práticas). Estou num profundo impasse. A planear a estrutura da tese, a escrever dois artigos, que já há muito deveria ter escrito e graças à paciência de generosos amigos ainda não os escrevi, a fazer um concurso e... não me sinto dentro de mim. Ultimamente, não tenho delirado, porque não tenho sentido a minha cabeça a delirar. É sob essa condição que eu consigo escrever, consigo desenhar, consigo pensar no que há de mais importante nas variadíssimas ideias que projecto para a tese. Atribuo esta minha incapacidade a várias coisas. Primeiro, a ausência de prazos rigorosos faz-me derivar no tempo. Se, ao menos, fosse no espaço! Segundo, a ausência de grandes acontecimentos: concertos, festas, mais concertos, mais festas! Terceiro, a minha mobilidade: as viagens entre Coimbra e Lisboa já não me satisfazem.
Hoje de manhã, o Eduardo perguntava-me por que é que eu ontem estava tão desanimada. Limitei-me a dizer-lhe que estava em dia-não. Todos temos dias-não e eu também e não vejo problema algum nisso. As razões do meu desânimo são exactamente estas que acabei de escrever. O impasse em que me encontro e em que tudo o que estou a fazer se encontra. De uma forma mais simples: falta-me força. Preciso, mais do que nunca, de um sítio distante, de uma linha de um oceano, de uma vista de um avião. Do sol rasante, de andar à deriva de sapatilhas.