quarta-feira, maio 16, 2007

Another place, another city

Marion, no início de Another Woman (Woody Allen, 1988), conta que arrendou um pequeno apartamento em Downtown, para escrever o seu novo livro. Escrevia sempre em casa, mas, com o barulho de obras vizinhas, tornou-se impossível fazê-lo. "Um novo livro é sempre um projecto absorvente e requer que eu me isole a sério de tudo o que não seja trabalho," diz-nos. Eu, eu só consigo escrever em Coimbra, em casa, no sótão. Este é o meu apartamento em Downtown. Quando estou em Lisboa, quase não consigo escrever ou o que escrevo nunca utilizo, apago, rescrevo, fica esquecido sob o nome de um qualquer ficheiro. Quando explico isto, são poucas as pessoas que o compreendem. Não é só pelo silêncio que necessito quando escrevo (embora este seja sempre um dos meus mecanismos preferidos para começar a escrever; começar, porque, depois, se a escrita fluiu, não ouço absolutamente nada a não ser a minha própria voz; sim, quando escrevo, ouço-me a falar e é sempre difícil acompanhar-me...), mas, sobretudo, pelo espaço. Existem pessoas que conseguem escrever num café, num jardim, à beira-mar... eu não. E, também, não é um espaço qualquer. Faltam-me as fotografias, a minha orquídea lilás e branca, os livros, o amontoado de livros em cima da mesa.
Há alguns meses atrás, comecei à procura de casa em Lisboa. Com o início desta nova fase, tornou-se fundamental ter, também, um espaço meu em Lisboa, para conseguir escrever. Os meus pais e eu vimos alguns apartamentos e confesso que em alguns me imaginei a viver, a passar os dias, a escrever, a receber os meus amigos. A Ana brincava comigo. Depois de tanto tempo a dizer que não ia conseguir sair de Coimbra para viver noutra cidade, andava à procura de casa em Lisboa. E dizia-me com um sorriso que lhe é único: "Ainda te mudas de vez para Lisboa!" Ao que eu respondia, prontamente: "Não, isso não! Passar aqui metade da semana, tudo bem; mas, a semana toda, não conseguia!" Mas, hoje, reparo que só estou em Coimbra, porque é aqui que escrevo (às vezes, estou em Lisboa com uma vontade enorme de voltar para Coimbra só para poder escrever), é aqui que eu consigo ter um ritmo de escrita (um ritmo que nada tem a ver com cadência, porque não sou nada disciplinada em relação à minha escrita), é aqui que eu tenho os mecanismos de que necessito para escrever (a meio da tarde ou ao início ou ao fim, saio e vou dar uma volta a pé, sem perder muito tempo, por exemplo), é aqui que está a minha mãe, que atura incondicionalmente as minhas birras, os meus desalentos, as minhas frustrações à procura das palavras certas, do ritmo perfeito. Em Lisboa, acontece-me, exactamente, o contrário. Não consigo escrever, a minha cabeça dispersa-se por mil e uma coisas, só penso em andar de um lado para o outro, sair, dançar! Se fosse para Lisboa, de vez, como a Ana apregoa, teria de reinventar Lisboa. E o mesmo aconteceria em Coimbra. Cada vez mais, acredito que temos de reinventar as nossas cidades, os nossos espaços quotidianos. Eu adoro este ritmo, a minha vivência, quase errante, entre duas cidades. Mas, no momento em que eu tiver de parar (talvez brevemente...), terei de as reinventar. E por que não fazê-lo sempre?

2 Comments:

Blogger AnaCAlmeida said...

A reinvenção de Coimbra pode passar por vir almoçar mais vezes connosco, não pode?...

quinta-feira, maio 17, 2007  
Blogger Susana said...

Claro! Para estar convosco e ver os meus irmãos... coisa rara por estes dias, se não me deslocar à baixa! ;)

sexta-feira, maio 18, 2007  

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