quinta-feira, outubro 20, 2005

20.10

Outro dia importante. Outro dia em que as palavras ficam muito aquém do que se espera delas. Não das minhas, delas próprias... Deveriam ser elas próprias a festejar este dia e eu com elas. Porque de certo modo também eu não posso existir sem elas, sem a sua presença e existência absolutas. Serei incapaz, por isso mesmo, de as proferir com leveza e destreza suficientes para tudo dizer quanto e como foi este dia.
No fim, a Madalena perguntava-me com uma estranha certeza de que teria sido óptimo, como é que tinha sido este meu dia. "Calmo", respondi-lhe. Mas agora vejo como fui injusta com ele e comigo própria. "Foi fantástico!", deveria ter-lhe dito. Porque foi.
Espero sempre suspeita por este dia. Tem-me sido marcado por razões mais distintas, que nunca sei o que hei-de esperar dele. E se de facto fora calmo este, houve determinados momentos em que me desdobrei em estados antagónicos. A felicidade de ouvir determinadas vozes e a angústia sufocante de encontrar as palavras certas para lhes responder e a surpresa de encontrar alguém, no meio de um mundo de nada, que disse pouco mais do que o que eu já sabia - que o meu avô era imensamente bom - mas me fez recordar o sabor agridoce das lágrimas e de um momento fora de mim. Tive ausências neste dia, também. Essa ausência no momento em que me deixei levar pelas recordações demasiado ténues e enuviadas do meu avô. "Sim, ele já morreu há muitos anos, era eu muito nova", respondia àquela Senhora a quem o meu avô tinha ajudado a fugir de casa dos pais e a casar com o ainda marido, porque os pais a maltratavam, a batiam, a impediam de ser feliz... "Eu era muito nova..." Dizia no dia em que o tempo muda tão pontualmente para mim. E, depois, todas essas ausências, insignificantes porém (aliás, descobrimo-las insignificantes no preciso momento em que denotamos a sua ausência), de outras palavras, de outras vozes. Afinal, redescubro-me sempre neste dia.