A Casa de Josephine – parte 1
Parte 1, porque antecipo que muito irei escrever sobre a casa de Josephine. Durante os próximos tempos, mudar-me-ei de malas e bagagens para esta casa. E terei que descobrir, como um dia A. escreveu sobre o quarto de S. "as infinitas possibilidades de um espaço limitado" (assumo a total opção de não citar explicitamente o autor). Este espaço limitado não é, porém, semelhante ao pequeno quarto de S. em Paris, se pensar em dimensões... Vejamos: quantos quartos de S. caberiam na casa de Josephine, curiosamente também em Paris (um acaso de que A. gostaria)? Pelas minhas contas, no mínimo, uns duzentos quartos. Mas se esquecer a pequenez do quarto de S. e relembrar o que A. diz sobre esse estranho espaço, consigo aproximar-me, ficar à porta pelo menos, da casa de Josephine. Numa primeira aproximação, tocar à campainha. "Aquele era um quarto de sonho, um quarto cujas paredes se assemelhavam à pele de um segundo corpo à volta dele, como se o seu próprio corpo tivesse sido transformado em mente, um instrumento vivo de puro pensamento." Qualquer coisa muito semelhante já ouvira a José, sobre a casa da Matriona, essa casa, essa personagem de um conto de Soljenitsyne: a casa devém Matriona e Matriona devém casa, indiscernivelmente. As palavras de José ganham uma outra força. Afinal, tudo o que me irá acontecer na casa de Josephine, acontecerá pelo trabalho no âmbito do seminário do José. Contudo, tenho esta impressão, senão uma terrível e cruel angústia, de habitar a casa de Josephine, como S. habitava o seu pequeno quarto ou Matriona a sua casa do meio do bosque. É inevitável. O trabalho apenas ficará completo, terminado, se eu devir - casa de Josephine. Tarefa árdua, pior!, tarefa difícil. Porque, embora A. diga sobre o quarto de S., esse não é o lugar da imaginação. É outra coisa.
Vontade não me falta. A casa de Josephine, como me confidenciou Molder no final da passada aula de sexta-feira, "é lindíssima!" E tenho a certeza que esta qualidade é utilizada por Molder não pelo estilo ou pela linguagem da sua arquitectura ou pelo conjunto de especulações em torno da casa, mas pelo que proporciona a quem a habita. E é único. Ou única. Se pensarmos numa só sensação a percorrer aquelas escadas imensas, largas, e outras, circulares, elípticas, a flutuar pela água, pelos corredores, pelo enorme salão a transbordar de luz... É lindíssima! Sim, é lindíssima! Não obstante nem sequer estar construída. Não vai ser difícil habitá-la. Mas vai ser difícil compreendê-la pelo que é. Tenho uma ideia ainda muito vaga do que pretendo compreender. Tenho, sim, este sentido de que só poderei compreender a casa de Josephine se devir casa e que nesse processo encontrarei os mecanismos para a sua compreensão. É engraçado que o que desejo compreender seja exactamente o que me proporcionará a compreensão. Sim, é muito divertido.
Nos meus primeiros passos na casa de Josephine, após me ser aberta a porta, ter entrado devagarinho, senti uma vontade enorme, quase louca, de fixar determinados momentos em imagens. E as próprias imagens teriam a capacidade fantástica de proporcionar um tal momento de intensidade máxima. Qualquer coisa idêntica ao que Francis Bacon diz sobre as fotografias e o facto de se sentir sempre capturado por estas (em especial pelas de Muybridge, da figura humana em movimento). Explicava a um amigo, talvez um dos que me conhece melhor, como é que eu estava a imaginar estas imagens (e estava a pensar em fotografias como em imagens digitais). Uma das minhas condições é que estas teriam que possuir uma certa "carga dramática." Foi a expressão que me veio à cabeça na altura, mas que não me parece de todo desadequada, ainda que um pouco aquém das minha próprias expectativas sobre as imagens ou sobre a própria expressão. Continuo sem conseguir dizê-lo de outra forma ou de melhor forma. Ainda não atingi esse grau. Também ainda nem sequer comecei a subir as escadas. Mas dizia-me P. que eu continuava na mesma. Tenho pena de não me lembrar das suas palavras exactas, mas diziam qualquer coisa sobre eu ser sonhadora, de andar sempre nas nuvens, etc. A minha resposta não adianta muito mais ao que já muitas vezes escrevi por aqui. Mas, quando à tarde, iniciava as minhas muitas leituras entrecruzadas (contra todo o método que havia defendido no dia anterior, de ser sistemática e pragmática nas minhas leituras, começar numa ponta e acabar noutra, tudo a eito, sem parar, nem vacilar), me deparei com uma pequena nota de rodapé com algumas palavras de um prefácio de Schönberg a uma segunda edição de um volume publicado por Loos. Não foi tanto o que as palavras significavam no sentido da frase, mas um pequeno fragmento. E esse pequeno fragmento era todas as palavras de P. juntas e todas as minhas respostas possíveis, actuais ou mesmo virtuais. Não o vou transcrever, porque correria o risco do seu sentido original se esvair e eu própria perdê-lo. E porque o sentido que despertou em mim é muito idêntico a esse que raramente me abandona e que teimo em perseverar em mim: ser por querer, por desejar, por prazer, por ser, infinitamente... E as coisas são mais bonitas. E a casa de Josephine é lindíssima!
Vontade não me falta. A casa de Josephine, como me confidenciou Molder no final da passada aula de sexta-feira, "é lindíssima!" E tenho a certeza que esta qualidade é utilizada por Molder não pelo estilo ou pela linguagem da sua arquitectura ou pelo conjunto de especulações em torno da casa, mas pelo que proporciona a quem a habita. E é único. Ou única. Se pensarmos numa só sensação a percorrer aquelas escadas imensas, largas, e outras, circulares, elípticas, a flutuar pela água, pelos corredores, pelo enorme salão a transbordar de luz... É lindíssima! Sim, é lindíssima! Não obstante nem sequer estar construída. Não vai ser difícil habitá-la. Mas vai ser difícil compreendê-la pelo que é. Tenho uma ideia ainda muito vaga do que pretendo compreender. Tenho, sim, este sentido de que só poderei compreender a casa de Josephine se devir casa e que nesse processo encontrarei os mecanismos para a sua compreensão. É engraçado que o que desejo compreender seja exactamente o que me proporcionará a compreensão. Sim, é muito divertido.
Nos meus primeiros passos na casa de Josephine, após me ser aberta a porta, ter entrado devagarinho, senti uma vontade enorme, quase louca, de fixar determinados momentos em imagens. E as próprias imagens teriam a capacidade fantástica de proporcionar um tal momento de intensidade máxima. Qualquer coisa idêntica ao que Francis Bacon diz sobre as fotografias e o facto de se sentir sempre capturado por estas (em especial pelas de Muybridge, da figura humana em movimento). Explicava a um amigo, talvez um dos que me conhece melhor, como é que eu estava a imaginar estas imagens (e estava a pensar em fotografias como em imagens digitais). Uma das minhas condições é que estas teriam que possuir uma certa "carga dramática." Foi a expressão que me veio à cabeça na altura, mas que não me parece de todo desadequada, ainda que um pouco aquém das minha próprias expectativas sobre as imagens ou sobre a própria expressão. Continuo sem conseguir dizê-lo de outra forma ou de melhor forma. Ainda não atingi esse grau. Também ainda nem sequer comecei a subir as escadas. Mas dizia-me P. que eu continuava na mesma. Tenho pena de não me lembrar das suas palavras exactas, mas diziam qualquer coisa sobre eu ser sonhadora, de andar sempre nas nuvens, etc. A minha resposta não adianta muito mais ao que já muitas vezes escrevi por aqui. Mas, quando à tarde, iniciava as minhas muitas leituras entrecruzadas (contra todo o método que havia defendido no dia anterior, de ser sistemática e pragmática nas minhas leituras, começar numa ponta e acabar noutra, tudo a eito, sem parar, nem vacilar), me deparei com uma pequena nota de rodapé com algumas palavras de um prefácio de Schönberg a uma segunda edição de um volume publicado por Loos. Não foi tanto o que as palavras significavam no sentido da frase, mas um pequeno fragmento. E esse pequeno fragmento era todas as palavras de P. juntas e todas as minhas respostas possíveis, actuais ou mesmo virtuais. Não o vou transcrever, porque correria o risco do seu sentido original se esvair e eu própria perdê-lo. E porque o sentido que despertou em mim é muito idêntico a esse que raramente me abandona e que teimo em perseverar em mim: ser por querer, por desejar, por prazer, por ser, infinitamente... E as coisas são mais bonitas. E a casa de Josephine é lindíssima!
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