sexta-feira, setembro 28, 2007

F...


Há dias que trago um texto na minha cabeça. Aparece de vez em quando com uma extraordinária definição que, julgava eu, assim que me sentasse para o escrever, ele se escreveria a si próprio. Mas, não. Aliás, cheguei agora mesmo à conclusão, que ele só aparecia na minha cabeça, porque eu sentia a necessidade de o escrever. De escrever as frases que passavam pelo meu pensamento àquela hora. Poderia começar este texto de outra forma. Há dias assim, em que nos apetece escrever FUCK no vidro da frente do nosso carro e passar, em câmara lenta, por uma avenida infinita, com árvores de um lado e de outro, e imaginar-nos rente aos seus ramos, às suas folhas, fechando os olhos, esquecendo toda a revolta que ficou uns metros, quilómetros, talvez, atrás... E quando esse dia se multiplica, que deixo de ver o que está à frente dos meus olhos e embato numa árvore? O capot do carro desfeito e eu intacta, a sair do carro, perplexa a olhar para o fumo cinzento que dele sairia. A mesma razão por este texto já não ser o texto que aparecia com extraordinária definição na minha cabeça. Num momento pensei que deveria escrevê-lo para esquecer definitivamente todas as frases que ocupavam e obstinavam o meu pensamento. Ainda ontem julgava sentir essa necessidade. Iria ser um péssimo texto (não que este seja melhor...). Um texto cheio de frases amargas, revoltadas, irritadas. Pôr um ponto final antes mesmo da existência de um texto. Todos os pontos finais deste serão certamente esse ponto final. Tudo o que fica para trás. A imensa avenida de árvores de um lado e de outro. Todos os pensamentos obstinados e revoltados. Tudo o que seja cinzento. Rewind. Em nenhum dia me apetece escrever FUCK no vidro da frente do carro. Mas apetece-me todos os dias fechar os olhos (não me apetece, fecho interminavelmente, sem noção do tempo ou do espaço) e sentir o vento tocar a minha pele como se eu não soubesse que era o vento que me tocava.

quinta-feira, setembro 06, 2007

De regresso

para G
Regressei a Coimbra já há alguns dias. Aliás, agora que penso no tempo dessa forma, regressei, precisamente, há uma semana. Mentiria se dissesse que tinha uma vontade enorme de voltar a escrever. Não tinha, é verdade. Mas, então, por que escrevo? Agora, neste momento? Até poderia dar uma resposta bonita, a mim própria, mas, mais uma vez, iria enganar-me. Poderei eu ter deixado de gostar de escrever? Creio que não... E, no entanto, coloco reticências. Há momentos assim. Creio que desta vez é a sério. Que as palavras serão sempre insuficientes para dizer as coisas, para dizer as sensações. Não estou a atravessar uma fase. Esta, será eterna. Nem partilho a angústia de Hofmannsthal, por exemplo. Não conseguirei abandonar a escrita a esse ponto, porque ainda continuarei a precisar dela para sobreviver. Porque ainda preenche uma parte de mim. Mas, agora, essa parte é ínfima, para não dizer prescindível. Porque continuo a gostar de escrever. Apenas sei, no meu íntimo, que não voltarei a escrever como antes. Agora, neste momento, escrevo, porque regressei à escrita de outra forma. Cumpro o que propus fazer, escrever. E faço-o com prazer (nem poderia ser de outra maneira!). Mas, por tudo o que sinto, as palavras não correm nas minhas veias como antigamente... e, novamente, um esforço terei de fazer para voltar a escrever. Hesitei. Hesitei por entre esse medo enorme de as palavras perder para sempre. O custo? Não existe. Como em tudo quando se ama. Mas, aqui e agora, tenho de fazer esse esforço para conseguir voltar a escrever. E resistir a contaminar as minhas palavras com a maior alegria de sempre.
Não escreverei sobre o meu tempo de exílio. Simplesmente, não consigo e duvidarei um dia conseguir. Talvez sejam, agora, as palavras a precisarem de tempo, para se acomodarem à sua nova condição. O meu, terminou. Uma ilha visitei. E, de certo modo, continuo a visitar, a ir lá na minha imaginação, em todas as coisas que faço e vejo e sinto. A imagem serve, apenas, para confundir. A ilha que aparece na minha imaginação tem outro nome. Mas, de regresso: não deixarei de escrever. Volto, apenas, ao início deste blog: a um exercício das palavras, quando preciso de as escrever melhor do que nunca. E, novamente, a esse medo terrível de as palavras falharem. E, no entanto, com essa certeza: falham sempre quando dizem a melhor coisa do Mundo!